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Na minha rua tem uma feira. Tá lá todo dia, menos segunda. E é um dos mais conhecidos lugares de Paris para se comprar frutas, verduras, flores, peixes e tudo mais que se encontra em uma feira de rua.
O Marché D'aligre é uma aula de sociologia. Das dezenas de bancas, só uma pequena parte é de franceses. O resto é de senegaleses, argelinos e de outros povos por eles colonizados. E é curioso observar as diferenças.
À procura por legumes, passei pelo estande de um marroquino que se esganiçava para anunciar o preço único de seus produtos. Uma versão velho mundo do nosso "é tudo um real". O sujeito atendia dez pessoas ao mesmo tempo. Um caos que o fazia repetir sintomaticamente a mesma sentença.
- Bonjour monsieur.
- Deux euros! Deux euros!
- O senhor tem abobrinha?
- Oui. Deux euros!
- Estão boas?
- Deux euros!
Ele apontava que nem um louco para o produto, enquanto pesava as compras de outro cliente.
- Quero meio quilo.
- Um quilo é deux euros, deux euros!.
A comunicação dele era simplória, mas funcionava. Dizendo apenas "deux euros" se entendia com todos à sua volta.
- E aqueles pêssegos?
- Deux euros!
- Quero saber se são bons.
- Ótimos. Só deux euros.
- Vou escolher alguns.
Esse foi o único momento em que olhou na minha cara.
- Non, non. C'est pas possible. Não pode escolher.
- Não pode?
- Não. Mas pode comprar um quilo por deux euros. DEUX EUROS! TOUT EST DEUX EUROS!!!
Disse isso e voltou aos seus afazeres múltiplos. Daí até o momento em que paguei, cerca de um minuto depois, devo ter escutado "deux euros" mais umas 37 vezes.
Satisfeito com o preço mas um pouco contrariado pelo atendimento, passei em uma banca capitaneada por uma francesa. Ao contrário da anterior, tinha uma fila grande, e a dona conversava com uma pessoa por vez, calmamente, levasse o tempo que levasse.
- Bonjour madame. A senhora tem champignons frescos?
- Oui monsieur. Eles estão ótimos. Olhe como são bonitos.
- É verdade.
- O senhor pode prepará-los na manteiga ou colocar numa salada.
- Fica bom?
- Fica delicioso. Mas não se esqueça de lavá-los muito bem antes.
- E essas cerejas?
- Acabaram de chegar.
- Estão doces?
- Prove uma.
- Merci beaucoup. Quero essas aqui.
- Très bien.
- Quanto dá?
- Alors... 200g de champignons e 200g de cereja. Algo mais?
- Non. C'est tout. Merci.
A mão que afaga é a mesma que apedreja. Se a gastronomia é coisa séria para os franceses, a hora de apresentar a conta não é diferente. E ela responde sem o menor constrangimento.
- Fica 8 euros.
Oito euros por um punhado de fungo e umas frutinhas vermelhas. Vinte reais! "Minha senhora, com vinte reais no Brasil eu compro metade de uma frutaria", pensei em voz alta, morrendo de vontade de largar o pacote ali e sair correndo.
- Pardon?
- Nada, nada. Embrulha
- Merci monsieur. Tenha um bom dia e uma ótima refeição.
Minha porção Paul Bocuse se sentia feliz com as iguarias adquiridas. Mas o lado Tio Patinhas estava semi-deprimido pela facada no bolso. Súbito, tive a idéia de passar em um outro estande.
- Quanto tá a banana?
- 80 centavos o quilo.
Comprei logo três quilos. Não sabia se ia comer aquilo tudo, mas agora estava certo de que faria uma refeição balanceada. Pelo menos no critério financeiro.