sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A Edith não existe

Fui juntando as peças dos meus longos e repentinos encontros com a Edith, e comecei a desconfiar fortemente que ela é fruto da minha imaginação. Só existe dentro da minha cabeça. Antes de me dirigir a um psiquiatra (aproveitando que em Paris eles são mais numerosos do que pombos e cachorros), compartilho as evidências que me levaram à conclusão.

Ela está em todo lugar ao mesmo tempo

Eu descobri que é só mentalizar e, voilà, a Edith aparece. Dia desses fiz um teste, e pensei nela ao sair do prédio. Foi só virar a esquina e ela surgiu. Estava com muita pressa, disse. Mesmo assim lascou uns 30 minutos de conversa, só terminada quando falei que precisava ir ao marché d'Aligre, comprar coisas pro almoço.

Logo depois, já no mercado, havia uma manifestação de imigrantes sem documentos. Senti uma mão no meu ombro. Era ela, e me entregava um panfleto, enquanto contava detalhadamente todos os motivos daquele protesto.

- Daniel, tem uma passeata hoje, às 15h. Vou estar lá. - Não duvidei.

De noite, fui ao restaurante associativo da rua, e pensei de novo na minha vizinha. Ao entrar, ela já estava lá, ajudando um casal de italianos a preparar o jantar.

- Oi, Daniel. Não posso conversar agora.
- Não se preocupe. De verdade.

A vantagem dessa onipresença é que, quando necessário, ela..

...resolve todos os problemas da redondeza

Precisa de pintor de paredes? A Edith tem um pra indicar. Quer comprar uma mesa? Ela conhece as lojas em promoção. O aquecimento central está com defeito? Fale com ela, e no dia seguinte está perfeito de novo. A Edith tem sempre uma resposta e uma solução pra tudo. Além de onipresente, é também onisciente.

Mas apesar de estar por perto quando eu penso nela, o que me intriga é o fato de que...

...meus amigos nunca a viram

Vários já vieram me visitar em Paris. Todos perguntam por ela. Da minha sacada, mostro o jardim do seu apartamento, conto o caso do pé de mesa que caiu e digo que certamente irão vê-la, uma hora ou outra. Nenhum conseguiu. Houve uma que fez plantão em frente ao prédio, com máquina fotográfica em mãos, esperando alguém "de sessenta e poucos anos e cabelo vermelho". Fotografou até uma velha punk, com cara de quem havia acabado de chegar de Woodstock, a pé. Mas a Edith, que é bom, necas.

Mesmo insistindo em não se mostrar para os meus amigos, ela continua aparecendo pra mim. E de uns tempos pra cá, vem acompanhada do...

...monsieur Thésée

A Edith tem um amigo inseparável e complementar. Enquanto ela fala pelas tamancas, ele nunca abre a boca. Seu nome é Monsieur Thésée (pronuncia-se têzê). Estranhamente, é a mesma pronúncia para "taisait", que significa "calava-se". E também o nome de um personagem mítico grego, Teseu, em português. São muitas coincidências estranhas.

Monsieur Thésée e Edith fazem uma dupla perfeita, apesar de não serem marido e mulher, pois ela...

...é casada com uma lenda

As dúvidas sobre a suposta existência da minha vizinha acabaram-se quando ela me apresentou seu marido. Aí eu percebi que estava mesmo delirando. Pois, vejam só, ele é um finlandês gorducho, de barba e cabelos brancos, sorridente e bonachão. A Edith, afinal, é casada com o Papai Noel.

As peças desse meu possível delírio encaixam-se tão bem que talvez seja mesmo caso pra psiquiatra. Vou perguntar pra Edith se ela não tem um bom pra me indicar.

18 comentários:

Dr. Simão Bacamarte disse...

Se é onipresente e onisciente e só você a vê, ou Edith é a versão francesa de Deus; ou é agente da CIA; ou é fruto de surto esquizofrenico.

No caso de ser Deus, você deve se perguntar qual o propósito desses contatos, talvez Ela tenha um plano para você.

No caso de ser um agente da CIA, você deve se perguntar porque raios eles tem interesse em sua vida. Ligações com o mundo árabe? Algum DJ pernambucano deixou algum pacote suspeito na sua casa? Etc. Ser agente da CIA explicaria o Monsieur Théssée. Ele seria o agente caladão recorrentemente retrado nos filmes de espionagem.

No caso de um surto, não se pergunte nada, a resposta pode não ser das melhores. Ou tente fazer uma teoria econométrica que lhe garanta um Prêmio Nobel (a lá Jnh Nash) ou tome um remedinho para controlar. Eu particularmente prefiro o Prêmio Nobel, porque adoro as estórias da Dona Edith.

Abs

Flor Falante disse...

Adoro quando você escreve sobre a Edith! Fico esperando para ver quando você vai contar alguma história louca sobre o quê ela fez!
Só cuidado ao perguntar a ela sobre psiquiatras, pois ela pode te levar à loucura de vez! :D
Ela sabe que tem uma legião de fãs por aqui?
Ah! Parabéns por conseguir publicar o Chéri simultaneamente nas duas línguas! Você pode, você consegue!
Beijocas transatlânticas
Flor do México

Aline disse...

Acho que você poderia tirar uma foto dela para quando seus amigos o visitarem...

Mas o caso a se pensar (e já tratar com o psiquiatra) é: se ela não existe, então pra quê você precisa que ela exista pra você?

Anônimo disse...

hahahahaha!!! daniel, tô aqui rindo sozinha até agora do papai noel. muito bom!!!!!

beijos.

Anônimo disse...

CariellÔ, eu tentei, me esforcei...Fiz até amizade com o povo do bar/café pra fazer hora até ela aparecer. Mas tudo o que consegui foi a foto da velha punk de Woodstock que usava um chapéu de neve em pleno verão europeu.
E nadica de Edith. Acho que realmente ela não existe. Que pena. Eu queria me ver no futuro! =D

G disse...

Hahaha...
não sei do que estou rindo mais, se do texto ou do comentário do dr. simão!!!

Anônimo disse...

Dani, é bom que ela exista pois já colecionou fãs por todo o Brasil. Eu mesma já me considero amiga íntima e se,por acaso, for fruto de sua imaginação, vá tratando de arrumar uma substituta real para nos apresentar quando formos aí.
Saudades e beijos de mami

Bruno Carmelo disse...

hahah Ela sempre foi a personagem mais bacana do Chéri, fico feliz que você tenha desenvolvido um "mito fundador" da Edith!

Anônimo disse...

Para ser mais precisa, alucinação em alto grau. Evidências fortíssimas, meu caro. E, concordo, as coincidências são mesmo muito estranhas. Fruto de um delírio, talvez coletivo. Já soube que se espalhou lá pelo nosso Brasil. Salvo seus amigos, os sortudos e avantajados que estiveram por aí e que tiveram a concreta oportunidade de questionar a (in)existência duvidosa da senhora ruiva do primeiro andar. O restante de seus leitores, todos, sem exceção, delira junto com você. E os sintomas são contagiosos. Acho que a cura pode ser mesmo uma visita à cidade luz. Talvez, o Dr. Simão deva também dar uma passadinha por aí. Ui, não sei quem está pior: você, ele... ou, agora, eu. E a Edith (não) existe mesmo? Vocês me deixaram esquizofrenicamente confusa. Síndrome do Monsieur Teseu; alucinações com Papai Noel em pleno outono Francês (para os mais desavisados, ele só aparece no inverno, que em Paris tem neve e começa em dezembro); pé de mesa que sai voando pela janela; suas ligações secretas com o mundo Árabe e com um DJ pernambucano (de onde o Dr. tirou essa?); a versão francesa de Deus. Agora estou realmente perturbada. E você, Daniel, está mesmo em ligação com o mundo árabe? Santa Edith nos proteja!

E essa história de que o melhor amigo da Santa é o herdeiro de Egeu ao trono de Athenas? Como é isso gente? O mesmo cara que travou lutas sangrentas com Minotauro e Procrustes, o esticador de corpos? Mesmo? Essa Edith é mesmo um mistério. Cuidado com o que você fala dela. E, sabe? essa síndrome do Monsieur Teseu é mesmo perigosa e altamente contagiante.

Alguém bate em minha porta. Estou receosa de abrir. Pode ser Edith de mãos dadas com o Minotauro. Ou talvez, eu deva convidá-los para um chá. Lá fora, 6 graus. Um friozinho bom, para se tomar chá com o Minotauro.

E a propósito, cuidado com os psiquiatras e especialmente com os psicanalistas de Paris. Eles acham que são eles próprios, e não a Edith, a versão francesa de Deus.

Um abraço meu, daqui da terra do Papai Noel. E não se preocupe, em dezembro ele te fará uma visita, de verdade!

Carinho imenso, rapaz inteligente
Soraya

Anônimo disse...

Dani, estou muito preocupada: tenho certeza que vi a Edith quando estive aí... e o pior é que até falei com ela. Será que de tanto você falar dela, também tive uma alucinação???
Beijocas!

Unknown disse...

...agora quem precisa de um psiquiatra sou eu... kkkkkkkkkkk

Concordo com a Gigi, o comentário do Dr. Simão complementou o texto genial e hilário!!

Aaaaah, sou fã da Edith... tomara que ela exista de verdade ou que você continue delirando, Daniel!! hehehehe

Juliana Medeiros disse...

Daniel, cada novo post é certeza de rolar de rir por meia hora e ainda ficar rindo, lembrando enquanto dirijo.. muito bom! Qndo eu for a Paris, tenho certeza de que vou ter outro olhar sobre a cidade luz! Continue escrevendo!
Juliana
:)

Chéri disse...

E agora a Edith - que eu ainda não sei se existe - descobriu o blog. Será, então, que o blog não existe também?

Anônimo disse...

Pô site bom meu!
Mesmo se não concordo com tudo sobre o que é Paris, a lingua francesa ou os franceses,são boas "crônicas", léger, agréablissime à lire :)
Boa continuação!! ;)

Fernanda De O

Anônimo disse...

(hehe) Só falta ela cantar como a Edith Piaf também...

Dr. Simão Bacamarte disse...

Chéri, vamos esperar Edith comentar. Ah, se ela comentar teremos -talvez- algumas respostas. Tudo agora depende disso. Se ela comentar em portugês ou em lapão (que tudo indica ser a língua nativa do Papai Noel) teremos um bom material.

Esquifo disse...

Absoluta, como a famosa vodka.

G disse...

Dani, eu acho que vc deveria convidar Edith para escrever um blog também!
Ela poderia, sei lá, escrever as suas memórias, dando para nós, seus fãs, uma oportunidade de conhecê-la melhor e, então, decidir se ela existe mesmo ou não. Ou será que ficaria mais difícil saber se ela é fruto de imaginação coletiva?
Pode ser que depois de ler como ela conheceu e se casou com Papai Noel, ou como ela guarda um arquivo com nomes de todos os profissionais e prestadores de serviço possíveis e imagináveis da cidade em casa, a gente comece a duvidar mais ainda...