sexta-feira, 24 de julho de 2009

Buttes Chaumont, 30ºC

O Buttes Chaumont é um dos mais bacanas parques de Paris. E ao mesmo tempo um dos menos cheios, talvez pelo fato de ficar afastado do centro e dos pontos mais turísticos da cidade. Durante a semana, mesmo no verão, é fácil encontrar lugares praticamente desertos para se esticar na grama, sob o sol.

Eis que havia esse piquenique com amigos, plena 3a feira à tarde. Preparei a mochila com a comida e fui de vélib, a bicicleta pública daqui. Paris é praticamente plana, portanto perfeita para adeptos do pedal. Só que o Buttes Chaumont fica em Belleville, uma parte alta da cidade. E a subida da rue de Belleville é uma das mais ingratas experiências ciclísticas da existência. De qualquer existência. Ali o cidadão descobre uma sensação totalmente única, mistura de calor, raiva, dor, frio, medo, tristeza e, no fim da ladeira, saudade do programa do Sílvio Santos. Ainda não entendi isso muito bem, mas o dono do Baú da Felicidade me veio à cabeça na hora.

Cheguei, tarde como de costume, e meus amigos já me esperavam. Eles, também brasileiros, tinham me ligado avisando que não estariam lá na hora previamente marcada. Então consegui a façanha de atrasar mais o já atrasado. Se tem um coisa na qual sou especialista é na arte de chegar tarde.

Vale dizer, uma diferença básica entre franceses e brasileiros é a organização. O francês mediano chega sempre na hora marcada, programa a agenda com no mínimo 6 meses de antecedência, reserva as passagens e hotéis para as férias de 2023 no Zimbabwe, "para garantir o melhor preço", e sabe o que vai jantar no primeiro sábado de maio do ano seguinte. Em um piquenique, então, ele está no paraíso. Tem certeza de que do cardápio constarão damasco, tomate cereja, queijo de cabra temperado, presunto parma, iogurte de pêssego, melão fatiado e salada de massa com um toque de tomilho. E sabe quem levará o quê, mesmo sem combinar antes.

No piquenique brasileiro todo mundo atrasou e só eu levei comida. Quando abri a mochila e tirei o que havia preparado, todos me olharam com aquela cara de "diacho, sabia que estava esquecendo algo". Tem problema não, onde come um, comem 12. Mesmo com o último pedaço de baguete sendo disputado à base do tapa na mão.

Pra compensar o fato de terem chegado tarde, meus amigos resolveram ir embora mais cedo. E aí fiquei sozinho por lá, com um quarto de maçã semi mordida, um livro e uma colônia de férias de crianças que chegou do nada e se instalou perto de mim.

Três garotos de 6 ou 7 anos jogavam futebol, enquanto a irmã mais nova de um deles insistia em abraçar a bola na hora do chute. Ao lado, quatro japonezinhas brincavam de casinha. Ou talvez fossem chinesas, não tenho tanta certeza. Mais ao longe, um menino puxava o cabelo de uma menina, e ela puxava de volta o cabelo dele. Os dois gritavam muito alto, mas uma das monitoras berrava mais alto ainda para eles pararem. E logo todas as crianças estavam gritando em um volume que eu imaginava inalcançável.

Um dos garotos marcou um gol, e saiu comemorando correndo pela grama, de braços abertos. No caminho, deu sem querer um cascudo na menina loirinha que pulava corda. Ela começou a chorar. A monitora tentou acalmá-la. Mas logo vendo que não adiantava decidiu aplicar os mais modernos métodos da pedagogia: abriu o bocão e tornou a berrar. Todas as crianças seguiram novamente o exemplo, batendo outra vez o recorde mundial de mais barulho em menos espaço. Só os dois que se arrancavam os cabelos pouco antes não participaram da terapia do grito primal. Eles agora divertiam-se esfregando terra um no outro.

A monitora histérica pediu ajuda para o monitor tiozão, que servia de montanha para as crianças subirem em cima, e decidiram puxar o barco. Logo todos estavam alinhados em fila dupla. O tiozão assoviava, a histérica dava um berro ou dois a mais. E o grupo foi caminhando para a saída.

Quanto a mim, comi o pedaço de maçã que restava, catei o lixo e dirigi-me à estação de vélib. A volta para casa era só descida. Mas se subisse de novo não havia problema. Afinal, it's summertime, and living is easy.

Escrito no auge do verão, este texto é de certa forma um contraponto ao Praça da Bastilha, -5 ºC, feito na semana mais fria no ano, em janeiro.

8 comentários:

Juliana disse...

Gostei muito do cardápio do piquenique dos franceses...agora vc?!Que coisa!Veja bem...pão e maça??Poxa..e nosso sagrado frango assado com farofa??
Aguade..em breve a amiga gourmet chega.

Guilherme Canedo disse...

Gostei bastante do seu texto!
Tem coisas que só percebemos quando paramos e respiramos, viajamos nas coisas simples que acontecem... percebendo como o mundo é grande em pequenas proezas!

abraços

Mami disse...

Hum... queijo de cabra ein? Piquenique muito bom para mami.
Saudades de vocês. Beijos e mais beijos.
Mami

Natália Vaz disse...

Lendo seu post dá pra entender um pouco mais sobre o filme "As Bicicletas de Beleville", uma das melhores animações que eu já vi, inclusive. =] As panturrilhas de Champion não deixam dúvidas de que por lá existem mesmo muitas subidas.

Bjos, Daniel!

Unknown disse...

Piquinique! Ai, que delícia! Lendo seu post me dei conta de que não faço um desde a infância... uau, faz tempo! Eram quintais tão lindos, grandes, gramados que eram verdadeiros tapetes verdes! Mas deixa o tempo dar uma esquentadinha que vou acionar os amigos pra tirar o atraso!!
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Ah, não posso deixar de dizer:'onde come um, comem 12' ...kkkkkk Jesus deve ter pensado nisso no lance da multiplicação dos pães, né?!!
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Bj!

Francesa disse...

Qualquer semelhança com uma francesa organizada é mera coincidência

G disse...

Dani, vc tem que vir visitar a gente em San Francisco e dar uma pedalada por aqui. Aí sim, vc vai ver o que é ladeira! (apesar de nunca ouvi falar de se chegar ao ponto de sentir saudade do Silvio Santos)
Ah, parabens hein?! Muitas felicidades para vcs (atrasada no post anterior!)

Anônimo disse...

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