sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Explicando o verão francês

Levou-me um ano e meio, mas esses dias tive o insight de que a questão do verão, ou da sua ausência, na França é muito mais do que uma simples consequência da posição do país no globo terrestre. É uma consequência semântica.

A explicação é simples.

Como se sabe, o vocábulo "verão" em francês é "été" (pronuncia-se êtê). Mas a mesma palavra é também o particípio passado do verbo "être", que é o equivalente aos nossos verbos "ser" e "estar". Portanto, "été" também significa "sido" ou "estado".

Percebe-se, pois, que já no vernáculo o conceito de verão na França é completamente ligado ao passado. A estação parece nunca vir. Já foi. E não tem perspectivas de volta.

Para ilustrar a teoria, escolhi completamente ao acaso uma frase juntando os dois sentidos de "été":

. L'été a été pourri. (O verão foi uma tragédia).

Já em português, a palavra "verão" soa semelhante à 3ª pessoa do plural do verbo "vir", conjugado no futuro: "virão". Ou seja, dá a sensação de algo que vai chegar sempre. E chegar de galera.

Para não parecer injusto, também selecionei aleatoriamente uma frase em português, contendo os dois termos citados.

. No verão, virão gatas bronzeadas de todos os lados.

Entenderam? É uma questão de perspectivas diferentes, causada pela gramática.

E já que tem passeata pra tudo em Paris, vou ver se junto alguns brasileiros para irmos às ruas exigir a troca do vocábulo que denomina a estação quente. Talvez por "veron", que parece "verão", com pronúncia e grafia afrancesadas.

Não sei se vai resolver. Mas vale a pena tentar.

22 comentários:

Anônimo disse...

Meu filho,
Vejo que você está meditando muito, bem mais que o necessário, aí em Paris. Só isso explica a (esplêndida, reconheço) análise semântica do verão francês. Mas, enquanto isso, os R$37,58 dos meus depósitos compulsórios no Fundo 157 -- não é da sua geração -- estão à deriva no Banco Alfa. Lembre-se que já passei procuração para você cuidar dessa grana, que aliás um dia será sua. De repente ela vai ser pega pelo Bush para ajudar os bancões americanos.
Acho que já é hora de pegar a Charlotte e vir para cá, que o sol e o mar estão ficando do jeito que todo mundo gosta, até os ingleses. A propósito, Luís e Joel, do Posto 9, mandaram abraços para vocês (parece que eles estarão se transferindo no carnaval para a Farme de Amoedo, por razões de mercado...). É isso.
Do saudoso Pápi

Adriana C. De Oliveira disse...

Adorei sua explicação do (não) verão da França. Nunca tinha visto sobre essa ótica.
Adoro seus textos.
Graças a uma busca no Google achei um texto seu no Overmundo (que confesso que até então não conhecia o site). E gostei tanto, ri um bocado do texto: De Porteiros e De Fofocas. Acabei procurando outros seus pra ler e virei fã do seu blog.
Gosto muito da forma que escreve.
Parabéns!
No aguardo de novas postagens!
Grande Beijo!!!
Adriana.

disse...

Essa explicação é melhor do que a tal historia do ano de 13 luas que os franceses insistem em me contar para justificar a ausência de verão.

Ah, se rolar passeata, me avisa que tô dentro! :-)

Parabéns pelo blog.

Anônimo disse...

veron também é aquele meio de campo da seleção argentina. sei se fica legal não...

G disse...

Ah, eu também tenho um frase, bilíngue, para explicar o verão de São Francisco: O summer sumiu!

confere lá do que estou falando: http://theressomeflowersinmyhair.blogspot.com/2008/06/summertime.html

hahaha...
bjo, e parabéns, seu blog está cada vez melhor.

Gi

Anônimo disse...

Falou pouco, mas falou bonito. Concordo plenamente com essa teoria. E valeu, Sol, pela passagem rapida em 2008. Até junho do ano que vem!

Anônimo disse...

Meu caro vizinho do sexto,

Sua análise semântica... que maravilha. Aliás, nunca havia pensado nisso. Muito bom, mesmo. Mas de repente, esse exercício mental em doses excessivas... não sei, não. Tempo vale ouro. É melhor idéia ouvir seu pápi. Olha o depósito compulsório no Fundo 157! Aquele, que não é da sua geração!

Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades...

Tem notícias da Edith, nossa vizinha do primeiro?

A Soraya, aquela, aproveita pra também mandar lembranças.
Diz que te gosta tanto e que seu blog a acompanha de um jeito especial.
Diz que o sol e o été também são raros por lá. Recebeu a carta quilométrica que te mandou?

seu vizinho do quinto,
Chicão

Unknown disse...

...Daniel, permita-me dizer: você é um lingüista nato!! Esse seu texto nada mais foi do que uma exemplificação brilhante e muito clara do conceito de imago-mundi! Sério mesmo! Estou impressionada. Impressionada.


...impressionada...

Anônimo disse...

Será que dons artísticos (e eu me refiro especificamente ao literário) é heriditário? Porque você, Chéri, tem alguem na família que também está de parabéns...
E ah! Pq vc nunca responde aos comentários???

Anônimo disse...

meeeu!!!show de blog!!aodrei todos os posts,e olha,apesar de eu nao ter chico buarque de vizinho,nem conhecer alguem que o tenha,em las vegas ano passado,conheci uma senhora,que ia pra lá quando jovem,e ela me disse que havia conhecido o frank sinatra e o dean martin!!!
se é verdade ou não,ja nao sei,mas essas historias animam nossas estadias nos lugares não é mesmo?!=)
tá add no meu fotolog!!
beeeeijo
;*

Chéri disse...

Olá, todo mundo que escreveu.

É bem legal o que esse espaço de comentários virou, com histórias pessoais diversas, sempre complementando o texto. E você tem razão, Paula: eu vou escrever mais por aqui.

Fabicatarse, valeu mesmo! Eu nem sabia que tinha esses dons lingüísticos (e vamos usar o trema enquanto ele ainda existe).

Beijos e abraços!

gra disse...

Mas Paris é atemporal e "asazonal"..rsrs

Anônimo disse...

Bravo. Em português "estio", em italiano "estate".

Unknown disse...

Verão, em português, também é o futuro do indicativo do verbo "ver", na terceira pessoa do plural. EX: Os brasileiros, ao contrário dos franceses, verão o verão.

Mariele Góes disse...

Seu blog é coisa linda de deus, Daniel. Nem lembro como entrei aqui, mas comecei a ler e me empolguei, me viciei. Em setembro do ano que vem vou fazer intercâmbio e vou morar em Paris, então o blog tem servido como um "olha-o-que-vem-ai-menina!" pra mim. Fantástico mesmo.

Acho até que você deveria escrever com mais frequência.

Anônimo disse...

Concordo com a Carla!
Os franceses não verão o verão chegar... never! (Neva?? Neve?? Hummmm, entendo, entendo....)
Voltem para o Brasil, cara!
Não tem recurso veranístico, nem semântico que dê jeito na situação!

Besitos
Flor do México

Thaís Salomão disse...

hahaha
muito boa a analogia :)

te adicionei nos favoritos; algum problema?

Anônimo disse...

Oi Cariello,

E a Ana. Morta de saudade de Paris. Voltei apaixonada... Droga. Quem sabe um dia?

Foi excelente encontrar com voce e falar mal das pessoas. Hhahahaha...

Olha nosso Flickr ae e veja as primeiras fotos.

Beijinhos.

http://cheriaparis.blogspot.com/

Anônimo disse...

Claro que esqueci do link. Ai vai:

http://www.flickr.com/photos/joneseanakrahl/

Juliana Vermelho Martins disse...

Deu certo? Acho que sim porque o verão sumiu de Curitiba! Tudo bem, estamos na primavera! Mas primavera de 15 graus, chuva e ventania é sacanagem! E isso é clima do meio-dia. De manhãzinha e no fim de tarde fica muito pior!

Se por acaso seu protesto funcionou, me avise. Vou fazer um igual por aqui. O Brasil está se "europizando". Tem cafés em cada esquina. Agora teremos também Natal com neve?!!! Assim não vai dar!

Antônio Padilha disse...

Ta tudo explicado mesmo! Vale também aqui pra Montpellier.

Acrescento outra analise semantica:

No créole da Martinica, o verão também é chamado de touju. Foneticamente, a palavra é proxima de toujours, sempre, tous les jours, todos os dias. Não ha evidência de qualquer relação com o fato de que ali é sempre verão. De qualquer forma, não é incomum se ouvir nas ruas de Fort-de-France:

Pendant le touju, je suis toujours content!

Anônimo disse...

Amado, que saudades! Essa palavra também não tem em francês, né?

Ao ler seu texto e comentários, notei que Carla teve o mesmo pensamento que eu... Temos o futuro do verbo 'ver'! Então há esperanças de que um dia desses vocês 'verão' o 'verão' chegar! :D
Feliz Ano Novo!
Flávia