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sexta-feira, 1 de abril de 2011
O pipoqueiro da fonte
Passeando com dois amigos que, como eu, também moraram em Brasília e estavam de passagem pela cidade, acabamos parando em uma pracinha nos fundos do Memorial JK. A idéia era ver o pôr do sol, espetáculo mais deslumbrante na capital do Brasil do que em qualquer outro lugar que conheço.
Ao chegarmos lá, dupla decepção. A primeira pelo tempo, que fechou de uma hora pra outra e tapou a visão do sol. A segunda pela conservação da tal pracinha. Mesmo localizada ao lado de um dos mais importantes pontos turísticos da cidade, estava abandonada, cheia de lixo e sem nenhuma vida. Logo ali, de onde se tem uma visão de 360º do céu, que alguém já descreveu como “o mar de Brasília”.
Com um misto de tristeza e decepção pelo estado do lugar, começamos a fazer uma lista do que, acreditávamos, poderia mudar por ali.
- Esse fosso em torno da praça tá vazio. Tem que colocar água.
- E os patos. Cadê os patos?
- Precisa arrancar esse mato também.
- Pra mim, o que falta é um pipoqueiro. – Disse.
- Pipoqueiro? – Perguntaram os outros.
- Isso. Um pipoqueiro é a síntese de tudo isso. Para um pipoqueiro vir até aqui, o lugar precisa estar bem conservado, limpo, agradável. Enfim, precisa atrair gente, principalmente crianças. Se tem criança e pipoqueiro, o ambiente é alegre e o ponto turístico é sem dúvida um sucesso. – Completei.
- O problema é que Brasília não é feita para o turismo, ninguém pensa nisso por aqui.
- É verdade. – Conformamo-nos todos.
Voltamos para o carro pensando nessa história do pipoqueiro e continuamos nosso giro pela cidade onde crescemos, tão saudosos que estávamos de Brasília e principalmente uns dos outros. Ao passar pela Torre de TV, percebemos perplexos que a famosa fonte luminosa estava ligada. Nenhum de nós três havia jamais visitado a fonte, que passara anos desativada. Sem hesitar, sugerimos quase em coro.
- E se parássemos ali?
Encostamos o carro e ficamos surpresos pela segunda vez: o lugar estava lotado! Olhamos uns para os outros, comentando que ali nem parecia Brasília. Nesse instante, como se tudo fizesse parte de um grande plano para nos ensinar a olhar com outros olhos o que já conhecemos, o espetáculo começou: a fonte passou a jorrar água nas mais variadas formas, em pequenos e grossos esguichos que se entrelaçavam, em nuvens de vapor, em chafarizes menores que moldavam o líquido como se fossem chamas (não me pergunte como faziam isso). Tudo sincronizado com luzes e música, chegando ao requinte máximo de haver projeções de imagens e filmes nas cortinas formadas pelas minúsculas partículas de água.
Nosso espanto tornou-se ainda maior quando um de nós reparou em algo que os outros ainda não tinham notado.
- Vejam, o lugar está cheio de pipoqueiros. Quem quer um saquinho?
Peguei um da salgada e continuei a observar a fonte, cercado de crianças.
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11 comentários:
Ai, que saudades de Brasília. E dos pipoqueiros de Brasília. E da fonte, que raramente vi ligada. E dos amigos de Brasília. E do CariellÔôÔôÔôÔô....muita! Tanta!
Beijo grande.
Conheço pouco Brasilia, fui algumas vezes. Lindo o que vc escreveu, principalmente o ter ou nao ter pipoqueiros! E vc os achou! Muito legal!
Adorooooo!
Ainda não vi a fonte ligada, vou dar uma passada lá para conferir sua bela narrativa.
Abraços
Na cidade onde nasci, lá no meinho do Rio Grande do Sul, a maior (e única) atração das noites era uma fonte de águas coloridas, que balançavam pra lá e pra cá ao som do Danúbio Azul. O "fenômeno" era conhecido na cidade pelo nome de "águas dançantes". O seu texto me remeteu de volta à infância, a correr por baixo dos túneis iluminados formados pela água. Na minha próxima ida à Brasília, com certeza provarei essa pipoca...
Grande abraço!
Minha terra tem pracinhas onde as águas vão dançar
A fonte du Trocadéro não brilha como a de lá
Do eixão vejo as estrelas
Lembrando destes sabores
Pipoca com anilina
Algodão de muitas cores
Mas ficar sozinho à noite
Sem a Chá também por lá
Não tem graça nem no Beira
Onde amigos vem brindar
Minha terra sem amores
Nascidos do lado de cá
Vira fosso sem patinho
Mato sem arrancá
(Foi mal aê, Seu Gonçalves! :))
Gallô, muitas saudades de você também. Vem me visitar, vem!
Anônimo, Ana Paula, Beto e Stella, vale conferir a fonte e, claro, comer uma pipoca. Se fosse criança, pediria a misturada, mas hoje em dia prefiro a salgada mesmo.
Gabi, adorei a poesia! Me fez até pensar em outro amigo nosso que encontramos apenas raramente, o Felipe.
Beijos a todos!
Oi, Paulo, tudo certinho?
Encontrei o seu blog no ‘Mundo Pequeno’ e vim fazer uma visitinha!
Fui lendo o seu post e imaginando... - não conheço Brasília -. E adorei ler que ressignificaram lindamente saboreando um saquinho de pipoca! A delícia do inesperado!
Também sou expatriada; sai do Brasil em 2000, e desde 2003, moro na Holanda. (O choque cultural existe e acaba sendo benéfico - de uma maneira ou de outra -. Sou da opinão que existem coisas boas e ruins em qualquer lugar do planeta! Nós é que temos que ressignificá-las à nossa moda!)
Será uma alegria se visitar o meu cantinho virtual, que é: http://josanemary.wordpress.com/mevrouw-jane/
E que quera ler o prefácio do meu livro: Mevrouw Jane (não foi feito por mim, mas por um escritor, reconhecido no mundo literário). Se gostar – ou não - por favor, deixe um comentário; vou adorar ler a sua opinião!
Tenha um ótimo dia - nessa França que conheço e adoooro -! Principalmente a região de Vendee!
Grande abraço.
Josane Mary
Daniel, mto legal seu texto! Sou de BSB, de casa, vejo a pracinha de trás do Memorial JK. Vc disse tudo! Parabéns!
O texto está ótimo, saudosista, delicado. Gosto da sensibilidade que encontro aqui, Daniel. Deixei esse mesmo comentário em seu FB. Realmente, você é cria da casa, nossa casa Brasília. E seu texto me faz pensar. Gente, nunca vi um pipoqueiro aqui! Crianças e fontes, muitas, mas não um pipoqueiro. Não pode ser! Será que preciso observar mais atentamente? Assim o farei. Foi bonito ler sobre seu passeio a três pelas pracinhas da nossa linda, linear capital.
me vê uma pipoca doce e um dedinho dessa prosa aí, por favor? bj CY
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