sexta-feira, 29 de maio de 2009

Cartinha básica

Alguém um dia desses me disse que La Poste, os correios daqui, é a segunda empresa mais admirada pelos franceses. Esse mesmo alguém não sabia dizer qual era a primeira, e gastamos um tempo besta, sô, especulando se era o McDonalds, McDô pra eles, o Starbucks ou alguma outra rede americana. É claro que não chegamos a lugar algum, mas ao menos arrumamos uma desculpa para algumas cervejas.

A verdade é que La Poste é para os franceses muito mais do que uma empresa que entrega cartas. É uma instituição. Uma mamma italiana, uma polka tcheca, uma vaca indiana, um ensopado de cachorro chinês. Bom, esqueçam o ensopado, não foi um bom exemplo. Enfim, La Poste é uma entidade da qual eles não podem ser dissociados.

É uma relação que beira o protecionismo, como a mamãe ganso que cuida das crias. Os franceses não apenas gostam de usar La Poste, eles fazem questão de arrumar utilidades para ela. Por exemplo, vai tentar resolver as tarefas bancárias mais básicas pelo telefone.

- Madame, estou ligando para avisar que mudei de endereço, e gostaria que você atualizasse meu cadastro.
- Manda uma carta dizendo de onde saiu e pra onde foi.
- Mas eu posso falar pelo...
- Uma carta.
- Vai ser rápido.
- Cê a erre tê a.
- ÉfácilmeunomeéDanieleeumudeiparaarua...
- Carta! Carta! Carta!

Ou então um pedido de demissão, que só é aceito se você enviar uma correspondência à empresa.

- Não aguento mais essa exploração, eu me demito!
- Como é que é?
- Eu me demito!
- Mandou uma carta?
- Não, ainda não. É que...
- Então senta esse maldito traseiro aí. E não esqueça: o relatório é pra hoje, Christophe.
- D'accord, d'accord.

Mesmo já estando há mais de dois anos em Paris, não faz muito tempo que entendi realmente o que significa esse totem francês. Foi quando estava em uma agência de La Poste, colocando moedas em uma máquina que imprime os selos na hora, e um senhor, barbudo e bem velho, chegou pedindo meu auxílio.

- Você pode me ajudar? Eu preciso comprar um selo, mas não sei usar essas máquinas modernas.
- Bien sûr, monsieur. Qual valor?
- Ah, é pra uma carta básica.

Comprei o selo e ajudei o senhor a colá-lo no lugar certo. Ele abriu um sorriso sem tamanho, disse que sua filha esperava ansiosamente pela correspondência. Fiquei feliz por ele e pela filha, mas achei meio estranho quando vi através do branco do envelope um cupom escrito "enlarge your penis" em letras garrafais. Vive La Poste, quand même!

12 comentários:

Flor Falante disse...

kiakiakiakiakaikaikaia!!!
Não posso crer, chéri!!
Até pra isso?
Pergunta: E o La Poste funciona?

Beijocas epistólicas!
Flávia

Mami disse...

Oi Dani,
eu estou com os franceses, como é bom receber uma cartinha básica!! Aquela que a gente abre ansiosamente querendo saber o conteúdo. Bem melhor do que receber um e-mail, que muitas vezes nem chega (caixa cheia).
Que saudades!!!
E viva o correio!!!
Beijos,
Mami

Mariele Góes disse...

Ah, então deve ser por isso que a universidade pra onde vou manda um formulário por semana para eu responder e mandar... pelo correio.

Mas eles me mandam por e-mail (danados), eu que fico gastando 10 dinheiros para mandar de volta pra eles... pelo correio.

Anônimo disse...

Oi Dani,
Não é que vc tem razão? Deve ser por isso que qualquer livro que ensine a falar francês, sempre tem uma das aulas dedicadas a "La Poste". Boa observação!!!!
beijos,
tia Vânia

Natália Vaz disse...

Hahahaha! Simplesmente adorei a do tiozinho. Já estava quase criando um sentimento de ternura por ele quando descobri o verdadeiro teor da carta dele.

Estou com os franceses e sua mãe. Receber carta é muito gostoso. Não é a toa que tenho todas as cartas que já recebi na vida, guardadas em caixas lá em casa. A impessoalidade dos e-mails me irritam. Mas confesso ser escrava de sua praticidade! ;)

RC disse...

Aqui no Brasil podia ser adequadamente rebatizado de "La Peste"

Unknown disse...

Estou com os franceses, sua mãe e a Natália Vaz!!! Adoooooro enviar e receber cartas. Tão bom achar, em meio a tantas contas e malas-diretas, uma cartinha escrita à mão! E mesmo que ache o e-mail a coisa mais fundamental do mundo, as cartas sempre estarão na minha vida. Aliás, os assuntos de e-mail e de cartas são completamente diferentes. Os e-mail são rápidos, diretos, geralmente escritos com pressa e espera-se que a resposta seja mais rápida ainda! Já as cartas não... elas são tão existencialistas... nelas a gente se demora... nada urgente... a gente sabe que a respota vai demorar. E os Correios do Brasil fazem muito bem seu papel... se não estou enganada é também a segunda instituição mais respeitada por aqui... a primeira é o Corpo de Bombeiros... o Mc deve ser a terceira... hehehehe
.
Bj1

Beto Só disse...

Cariello, como falo com você? Correio precisa de alguém em Paris pra fazer a cobertura do acidente com o avião da AirFrance.

Beto

Douglas Chanan disse...

A minha experiência com o Le Poste não foi muito boa não. Fui incluido no pequeno percentual de falhas deste sistema ao perderem minha mala em um envio entre a França e Portugal. Até hoje agradeço a existência dos Correios brasileiros.

Vilma M. Pinto disse...

Seu blog é óooooootimo. Já morei em Paris , adoro Paris e me sinto ai quando o leio...
Beijo

Juliana Vermelho Martins disse...

Realmente, La Poste é uma instituição! E é o único "banco" que aceita estrangeiros como clientes antes mesmo dos eternos três meses que demoramos pra ter o "Titre de Séjour".

O problema é que, sem conta no banco, sem RIB. Sem RIB? Então, chéri, sem contrato de aluguel, sem cartão de transporte, sem celular, sem TV a cabo, sem internet, sem telefone fixo (essas coisas básicas do kit auto-exílio), sem nada! Sem RIB vc não existe, não é ninguém!

Então, Vive La Poste, o banco! Se bem que, enquanto estivemos por aí dizíamos que como banco eles são ótimos correios... Tão bons que a chamávamos de "La Boste" :-)

Unknown disse...

Li, vi e favoritei. E é o primeiro blog do qual me tornei seguidora!!!!