sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Sartre em si

Uma coisa que me intriga nas teorias de Jean-Paul Sarte é essa classificação de seres em Em-si e Para-si. Se bem entendi, o Em-si é um objeto qualquer que possui uma essência definida, criado para suprir uma necessidade, tipo um sanduíche de mortadela, uma calça capri ou uma bandeira do Vasco.

Já o Para-si cria as relações funcionais e temporais entre os seres Em-si. Por exemplo, é um sujeito que acorda, dá uma bocada no seu sanduíche de mortadela, veste a calça capri e pendura a bandeira do Vasco na janela.

Até aí, tudo bem.

Sartre continua dizendo que o Para-si é um ser que tem conhecimento a respeito de si mesmo e do mundo. Já o Em-si, em se tratando de consciência, ele não tem nenhuma. Não sabe nem mesmo que existe.

Eu concordo que o Em-si não tenha consciência. Afinal, não costumamos ver sanduíches de mortadela reclamando. "Ei, caramba, morde com menos força". E calças capri, até onde se sabe, ainda não saem andando sozinhas pelas ruas.

Já dizer que o Para-si tenha consciência, é questionável. Discute-se nos meios filosóficos se um cidadão que pendura a bandeira do Vasco na janela pode ou não ser enquadrado como um grande conhecedor do mundo.

Entendam que eu não tomo partido. Apenas tento compreender Sartre.

Bem, ele ainda dizia que os objetos do mundo - os seres Em-si - apresentam-se à consciência humana por meio de suas manifestações físicas. E os Para-si não têm uma essência definida. Ou seja, determinam sua existência a cada momento, e têm a liberdade de mudar de vida desse segundo em diante.

Disso tudo, pode-se concluir que o sanduíche de mortadela é a manifestação física da idéia do sanduíche de mortadela, o que faz um grande sentido quando se vai ao mercado municipal de São Paulo e se depara com o baita sandubão que eles preparam. Ali entende-se a existência do sanduíche como algo sólido. Bem sólido.

A calça capri, um ser Em-si, não tem consciência de sua existência. Sartre, se ainda estivesse vivo e utilizasse esse exemplo, provavelmente reformularia sua teoria. Diria algo como "no caso da calça capri, ela não tem a consciência de sua própria existência. Parece que quem veste uma também não a tem".

E a bandeira do vasco, também um ser Em-si, para existir depende de um ser Para-si, que é o sujeito que a pendura na janela. Como esse mesmo ser Para-si tem a liberdade de mudar o rumo de sua vida a cada instante, pode ser que ele deixe de torcer pelo Vasco. Seguindo o raciocínio, se todos os torcedores do Vasco mudassem de idéia e passassem a apoiar, por exemplo, o XV de Piracicaba ou o Itabaiana, a bandeira do Vasco deixaria de representar a idéia de torcedor do Vasco. Portanto, deixaria de fazer sentido a sua existência. O que, para alguns, faria muito sentido.

Não sou eu quem diz, é Sartre.

6 comentários:

Juliana Vermelho Martins disse...

Só discordo da calça capri! Aliás, tô usando uma nesse momento e completamente consciente de mim mesma.

Sei não, tô achando que essa calça tb deve ter consciência. Avançada! Tem dias que ela "me chama". Agora me deu até medo! Será que a calça capri tem 'em si' mesma, uma consciência que atrai as pessoas 'para si'? Se não for assim, por que a gente ainda compra?

Credo! Filosofia desse tipo numa sexta-feira deve fazer mal à saúde!

:-)

Bruno Carmelo disse...

Oi, Daniel!

Gostei bastante desse post, foi ousado pegar um territorio que sempre te atraiu (o conhecimento popular) e confrontà-lo com idéias sartreanas...

E gosto também do pequeno deslocamento: ao invés de estabelecer entraves de comunicação entre duas pessoas diferentes, como de costume, você faz isso dentro de uma mesma idéia. Bacana.

Abraço.

Unknown disse...

...uau, fiquei zonza!! Muito clara sua explicação, viu?! Teria sido de grande valia nas minhas aulas de filosofia da lingüística...

...quanto ao pão com mortadela do Mercadão de SP... esse é um indivíduo concreto, completo, um ser em si, para si, para mim, para nós para todos, afinal, é, acima de tudo, gigantesco! Adooooooooooooro!!

Bj!

Anônimo disse...

Para ser mais contemporaneo, talvez os Vascainos passem a torcer pelo Nautico. Depois de assistir a um belo gol de bicicleta no primeiro turno, agora assistiram ao time ser batido pelo Timbu em Sao Januario. De mais a mais, Sartre e os demais filosofos respeitaveis amam muito suas idéias, a ponto de criar nomes para as coisas do mundo (criando um mundo à parte) e complicar o descomplicado.

Anônimo disse...

felizmente a produtora do texto não teve a sensibilidade de absorver todo contexto de sartre de quando ele formulau o en-si e o para-si.esses termos são algo muito alem do que uma mortalela de ntro do pão, a calça e bandeira. Esses são termos que ele usou para podermos observar a nos memo como seres que existem, e com certeza nem um dos leitores desse texto, que por acaso tinham universitarios,não fizeram jus ao sentido que sartre tras. com certeza eram estudantes de faculdades particulares.

claudia otero disse...

muito bom mesmo!!

alias acho a calça capri o fim da picada!!

bjos