sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Detonando em Paris


Um amigo meu, viajando pela Europa, ficou uns dias aqui em casa. Saiu pra andar pela cidade e entrou num restaurante que lhe indicaram.

- Bonjour.

O bonjour dele é ótimo, sempre acompanhado de um sorriso. Mas é tudo o que sabe de francês.

- Bonjour, respondeu a garçonete, também sorridente.
- Você fala inglês?

A moça, que no início mostrava todos os dentes, fechou a boca como um bico de pato. E a cara também.

- Não.

Respondeu e ficou olhando séria pra ele. E ele pra ela. E ela pra ele. E ele pra ela. E nenhum dos dois desviava o olhar.

- Que-ro co-mer, falou devagar o meu amigo, fazendo mímica com a mão perto da boca, num esforço para ser entendido.
- Comida, food, fome, hungry!

Ela nem ligou.

Enfezado, o sujeito apontou no cardápio qualquer coisa e esperou. Comeu e pagou o que devia, sem deixar gorjeta para a garçonete.

De cabeça quente, foi visitar umas lojas. Como ele é DJ, aproveitou para comprar uma moderníssima aparelhagem de discotecagem. Com medo de ser assaltado, pediu pro atendente embrulhar. O vendedor podia ter toda a boa vontade do mundo, mas revelou-se um péssimo empacotador. E fez uma gambiarra com pedaços de papel e fita crepe que deixaram o pacote muitíssimo mais suspeito do que antes.

Depois andou até a FNAC para comprar uns discos. Encantado com o tamanho da loja, foi se metendo pelas seções, bisbilhotando aqui e ali, olhando os lançamentos, escutando trechos de músicas. E esqueceu o embrulho num canto.

Na França, como em toda a Europa, há um verdadeiro pavor de pacotes abandonados. Eles já foram vítimas de atentados com bombas deixadas em mochilas e latas de lixo, então destroem tudo o que é potencialmente perigoso.

O meu amigo, cabeludo, barbudo e longe de ser o cara mais bem vestido do mundo, passaria como terrorista até no Afeganistão. Bin Laden mudaria de lado na rua se o visse passar. Na França, então, devia ser suspeito desde que chegou ao aeroporto.

De repente ele percebe uma movimentação estranha na loja. Atendentes apressados, pessoas tensas, um clima esquisito no ar.

- Que pessoal estressado.

Súbito, uma das atendentes passa correndo por ele. Mas o reconheceu e soltou uma mistura de inglês com mímica e alguns saltitos semi-histéricos.

- É seu o pacote abandonado lá atrás? É seu? É seu?
- Vixe!!! É meu.


A moça o pegou pela mão e saiu atravessando as seções de clássicos, jazz, blues, soul, reggae... Um longo caminho até chegar no rock, seu ponto de partida.

- É dele! É dele. Deixa aí.
- É mine. It's meu!
Meu pobre amigo já confundia até os idiomas.

O embrulho estava sendo encaminhado para uma sala isolada, mas eles chegaram a tempo. Um dos caixas pegou o pacote e entregou pra ele, sem esboçar o menor sorriso.

À noite eu o encontrei em casa.

- Como foi seu dia? Tá se virando bem no francês?
- Olha, posso dizer que eu tô quase detonando.

8 comentários:

Anônimo disse...

Hahahahahaha
Muuuuuito bom!!!
Thalles fazendo sucesso nas Oropaaa!!

prolixa disse...

A-DO-RO (isso mesmo, separando sílabas) tudo que você escreve. Fico rindo sozinha que nem doida. Sou fãs suas demais. BJIM e não estranhe esse nome. É que agora tb tenho um blog pra chamar de meu. www.twitteratura.blogspot.com. :o) CY

VALHA!!! disse...

Comoção geral.

=)

=*

Anônimo disse...

Bem, vc teria histórias hilárias se eu aparecesse por aí. Num patavina de francês.
Pera aí!!! Num acredito que é a pessoa que "gallô" disse. Agora que o trem ficou engraçado mesmo. Imagino cada cena relatada agora com personagem concreto. Uhauaahauahaua. Mto bom!
Tô esperando vc mês que vem, heim?
Bjossssssssss

Anônimo disse...

o daniel tem licença poética...
foi muito bacana, meu velho!

Anônimo disse...

Esse blog tá cada vez melhor. Já pensou em publicar um livro?

G disse...

Oi Daniel, é a Gi mulher do Ricardo, td bem?
cara, eu sempre leio o seu blog, sou super fã, vc escreve muito bem e acho que vc devia levar a sério mesmo a idéia de lançar um livro com as suas aventuras de brasileiro em Paris!
bjos e boa sorte aih! quando a gente puder vamos te visitar!

Chéri disse...

Oi, Gi e todo mundo.
Obrigado mesmo! Se alguém conhecer um editor dando sopa por aí, dá um toque! :)
Beijos e abraços.