sexta-feira, 2 de março de 2012

Andar de baú é uma parada


Cheguei ao ponto e meu ônibus tinha acabado de passar, confirmando a primeira regra dos usuários de transporte público: o momento da sua chegada à parada é exatamente o mesmo da partida do ônibus que você quer pegar. A segunda regra diz que o seu tempo de espera a partir de então será proporcional à sua pressa.

Depois de eras passou outro, dei sinal, não era o meu, dei outro sinal pra dizer que não era o meu, o motorista já havia começado a frear e acelerou novamente, fiz um “ok” pra agradecer a boa vontade, o motorista achou que eu havia mudado de ideia e reduziu outra vez a velocidade, sacudi as duas mãos pra deixar claro que não o havia chamado, o motorista parou ao meu lado e perguntou se eu já havia me resolvido.

- E aí, já se resolveu?

Eu já havia me resolvido e de qualquer maneira não ia subir naquele ônibus nem que fosse o meu e o último do dia, tamanha a cara feia dele, do seu parceiro cobrador e do passageiro bombado sentado na primeira fila.

Passou mais um ônibus, que também não era meu e por isso não dei sinal, mas era de muitas outras pessoas que esperavam no mesmo ponto, deram sinal ao mesmo tempo e depois se acotovelaram para subir, parecendo um formigueiro humano. Quando percebi o meu vinha logo atrás mas só acenei depois que ele já havia passado à toda. O motorista não me viu, ao contrário da velhinha do último banco, que me mandou um tchau, não sei se por compaixão ou para corresponder à minha involuntária boa educação.

Pra matar o tempo, resolvi contar os carros verdes da rua, mas parei no 35º porque a brincadeira não tinha a menor graça. Tirei o celular do bolso, olhei para o relógio, vi que estava atrasado, recoloquei o celular no bolso, tirei-o novamente, olhei mais uma vez para o relógio, certifiquei-me que estava atrasado, guardei-o e quando o peguei outra vez percebi que o meu ônibus havia parado e todo mundo subido, menos eu, que fiquei olhando para o telefone. Tirei-o mais uma vez do bolso e tive a absoluta certeza de que agora estava atrasado de verdade.

Longos tempos depois, avistei um ônibus de longe e comecei a acenar trezentos metros antes de ele chegar ao ponto para ter certeza de que dessa vez o pegaria, só que o motorista decidiu não frear, ignorando totalmente meu apelo e meus saltos com as duas mãos abertas que davam a impressão de que eu fazia polichinelos, modalidade de exercício que deixou de existir “depois da eleição de Tancredo Neves”, segundo um amigo. Mas o destino parecia estar ao meu lado e o coletivo parou no sinal, então bati à porta, com um sorriso de vitória, e o sujeito não teve escolha a não ser abrir pra mim. Acomodei-me em um banco desconfortável e aproveitei para jogar Tetris no celular. Depois de uns 15 minutos levantei a cabeça e só aí fui perceber que havia pego a rota errada.

7 comentários:

Cristovao disse...

Sambiba, por que tu ainda fazes polichinelo?

Hugo disse...

Excelente, como sempre!

Anônimo disse...

Que diferença deve ser usar ônibus em Paris e depois usar essas carroças de Brasilia. Ainda bem que ao contrario do transporte publico o seu blog tem a mesma qualidade do lado de lá e do de cá.

Beijos da Roberta.

Anônimo disse...

É engraçado né... nem sei andar de ônibus em Brasília, mas em Paris sei direitinho... na maior segurança.. chegamos na estação de trem e pegamos metro direto para hotel de boa, com mala e tudo. Agora em Brasília por exemplo, (não moro lá), não tenho nem idéia (e nem coragem) qual ônibus pegar.
Mari.

Não importa disse...

Hhahahahahahahahaha!!! Hilário e inteligente, como sempre.

pululante disse...

a dúvida que fica é: que lugar é esse em Brasília em que passam tantos ônibus (ainda que os errados)?

Soraya Salomao disse...

La ville qui n’aime pas le Vélo et la Liberté. Saudades da Vélib’, hã! Quem diria, Monsieur Chéri!!!