Blanca mora no último apartamento do último edifício da última rua do 17º e menos badalado arrondissement de Paris.
De segunda a sábado ela se levanta cedo para ir trabalhar e só volta pra casa depois de cumprir uma jornada que varia de 10 a 12 horas diárias. Acorda sozinha, pega o metrô sozinha, caminha pelas ruas sozinha, trabalha sozinha e é sozinha que dorme à noite.
Blanca não tem tempo de parar para comer, por isso sempre carrega sanduíches, frutas e biscoitos na bolsa. Leva também uma garrafinha de água e de vez em quando um chocolate. Ela se alimenta nas poucas pausas que faz, enquanto anda de um lugar para outro.
Aos domingos ela fica na cama a manhã inteira, recuperando-se da semana puxada. Acorda no início da tarde, prepara um almoço rápido e volta a dormir. Desperta mais uma vez, come de novo e retorna ao leito. Às vezes alguém a convida para um encontro dominical. Às vezes ela vai. Às vezes não tem forças.
Blanca deixou sua casa há sete anos. E há dois não vê os filhos.
Todos os dias ela liga para os parentes e passa horas colada ao telefone. Durante muito tempo essa foi a única forma de contato, mas agora ela tem internet e aprendeu a usar a webcam.
Blanca veio a Paris ralar dia e noite pra juntar dinheiro e mandar pra família. Com o que enviou, seus filhos puderam pagar a faculdade e ainda algum conforto.
Às 4a feiras ela faz duas horas de faxina aqui em casa. O apartamento é pequeno e na verdade a gente nem precisava de alguém para limpá-lo. Decidimos chamá-la porque uma amiga disse que ela tinha que acumular horas de trabalho para conseguir o visto provisório e poder ficar legalmente na França.
Blanca tem uma dura rotina, tão dura quanto a das faxineiras e domésticas brasileiras, mas com a diferença de estar em um país que não é o seu, comunicando-se em uma língua que não é a sua.
Apesar de tudo, ela está sempre sorrindo e bem disposta, principalmente quando fala da Colômbia.
Blanca me disse essa semana que em fevereiro não vem trabalhar. Radiante, contou que seu visto de permanência finalmente será liberado e ela vai visitar seu país e sua família. Com o documento em mãos, pode ir a Bogotá e depois voltar tranquilamente para Paris, sem correr o risco de ficar detida uma semana na imigração do aeroporto, sofrendo ameaças, dormindo no chão e dividindo um banheiro com 50 outras pessoas, como aconteceu da última vez.
Eu fiquei feliz por ela.
Esse texto faz parte da série "Autour de Paris", de crônicas dedicadas a cada um dos bairros da cidade. Para ler os outros, clique aqui.
6 comentários:
Oi Dani, eu tb fiquei feliz por ela.
É muito duro ficar longe dos filhos!!!
Saudades de
Mami
Seu blog aborda assuntos muito interessantes, vou passar por aqui mais vezes.
Quanto ao texto..as vezes fazemos sacrifício por algo maior que iremos colher lá na frente, creio que a mãe irá ter o que tanto almeja quando ver os filhos formados e encaminhados para a vida.
Tem vezes que eu morro de rir lendo esse blog. Tem vezes que eu choro de emoção. Só não fico indiferente nunca.
A Europa está repleta de Blancas limpando casas, cuidando de crianças, varrendo ruas, entregando pizzas, servindo mesas e lavando pratos. Todas dão muito duro e merecem nosso respeito e admiração.
Belo gesto o seu, Daniel!
Beijos!
Pobre Blanca! Gostei muito dos blogs, tanto em francês quanto em português. Adicionei os dois endereços aos blogs que escrevo. Acebei de começar um, depois dê uma passadinha lá! O site é http://www.revistafrancesa.com/
Tenho outro blog sobre minhas experiências de dona de casa totalmente inexperiente. Também tenho um vizinho músico. Ele é saxofonista. E nem sempre estou na vibe de ouvir jazz, sabe? Fazer o que.. Abs!
Vi que seu blog tb está concorrendo ao TOP100....vim aqui bisbilhotar e gostei bastante! Virei seguidora. Passa lá no Coisa Parecida! www.coisaparecida.com
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